ARETÉ

22.02.2016 -

Luta

“– Havia vários tipos de lutas: numa modalidade eram contados pontos a cada queda do adversário no chão, bastando que um dos lutadores encostasse uma parte do corpo ao chão, como o joelho, por exemplo, para que seu adversário pontuasse; aquele que derrubasse o adversário três vezes era declarado vitorioso. Outra modalidade permitia que a disputa prosseguisse, inclusive com os lutadores no chão. O combate só se encerrava quando um dos lutadores sentia que suas energias haviam se esgotado ou estivesse imobilizado por uma chave aplicada pelo adversário, quando então levantava o braço com um ou dois dedos estendidos para o árbitro. Havia nomes os mais variados para os diferentes golpes e estratagemas utilizados. Os socos, por serem próprios do pugilismo, não eram permitidos nessa modalidade.
 
– No pugilismo, os oponentes revestiam com tiras de couro uma ou ambas as mãos, como naquela representação que vimos no início com os dois garotos competindo. O combate terminava com o nocaute. Havia regulamentações sobre o tipo de couro a ser usado e os golpes proibidos, mas a violência desse tipo de luta era considerável. Mais tarde os romanos  permitiram que as luvas fossem revestidas com cravos de chumbo: isso tornou a disputa desumana e desprovida de técnica, pois os golpes desferidos tornaram-se muito mais perigosos.
 
– Ainda havia outra forma de luta, o pancrácio, que é caracterizado por muitos como uma forma mista de luta e pugilismo. Aplicar golpes nos órgãos genitais, morder e enfiar os dedos nos olhos, nariz ou boca do oponente eram as únicas restrições para essa modalidade.
 
– Havia diversas versões na Antiguidade sobre quem teria sido o introdutor de cada uma das modalidades de luta. Diziam, por exemplo, que Teseu havia vencido o Minotauro aplicando golpes de pugilismo e luta, como no pancrácio. Apolo teria criado o pugilismo ao lutar e derrotar um malfeitor que atacava os peregrinos que se dirigiam para Delfos. Héracles era o  protótipo do lutador. Derrotou inimigos gigantescos e feras também. Este vaso aqui mostra Héracles derrotando o Leão de Nemeia. Ao seu lado, acompanhando a luta, estão Iolau e a deusa Atena. Agora observem a precisão com que o artista captou a luta: Héracles domina a fera, que tenta resistir ao golpe usando a força de suas patas contra o herói. A capacidade  do artista em perceber e retratar a complexidade da cena é impressionante, vocês não acham? Observem o leão tentando reagir e livrar-se da chave aplicada por Héracles. O artista chega a registrar os detalhes da tensão muscular do felino.
 
– Sim, é realmente impressionante a qualidade das representações, principalmente daquelas que captam o movimento – respondeu Cléia. – Mas a luta definitivamente não é meu esporte preferido – completou.
 
– Sua repugnância aos esportes violentos é compreensível – retrucou Alberto. – Entretanto, comparadas aos combates de guerra, bastante comuns na época, poderíamos dizer que as diversas modalidades de luta eram uma amenidade. A luta como esporte era, na verdade, um preparo do cidadão para a guerra. Não podemos nos esquecer de que as batalhas eram travadas corpo a corpo. A destreza, o moral e a robustez dos guerreiros eram fundamentais.
 
Naquele instante soou um alarme em toda a sala. Parecia um sinal de fim de aula amplificado e ainda acrescido de um som de sirene. Uma funcionária veio em nossa direção, dizendo em voz alta:
 
– Prossochí! Prossochí!
 
Olhamos todos para a direção que ela apontava e vimos o Antônio com o braço em volta do Pedro tentando aplicar o golpe descrito na imagem. Na brincadeira eles esbarraram numa vitrine da exposição e isso fez soar o alarme. Alberto e Cléia intervieram imediatamente, deixando os dois com os olhos no chão. O resto de nós mal podia conter o riso, embora tentássemos.
 
Olhamos para a vitrine que os meninos haviam esbarrado e vimos a cena que inspirou a brincadeira dos dois: um lutador aplicava um golpe chamado “chave de pescoço”, ou “mata-leão”, o mesmo que Héracles aplicara no leão que havíamos visto no outro vaso.”

* Artigo foi extraido do livro Uma viagem à Grécia: os jogos olímpicos e os deuses, de Stylianos Tsirakis.

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